Ângela Martins Lourenção.
Pós-Graduanda em Direito Administrativo pela PUC- MINAS. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha – FADIVA. Atuação no contencioso judicial e administrativo.
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, traz em seu art. 225 as normas de proteção ao meio ambiente e prevê no inciso, VII, a proteção à fauna e flora, sendo vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica e provoquem a extinção de especiais que submetam os animais à crueldade.
Cristalino dizer que, em tese, os humanos, de certa forma, também são considerados animais e, como nós, os animais irracionais são seres sensientes capazes de sentirem dores e outras sensações.
Atualmente, para além da testagem em animais, no mercado de industrias, é possível encontrar outros meios que verifiquem a toxidade dos produtos, não obstante as empresas continuarem diariamente realizando testes em milhares de animais.
De tal sorte, é constante o aumento da preocupação da população que abona esse tipo de práticas para a indústria cosmetológica e estética. Assim, empresas menores, a fim de conseguirem evitar a prática de experimentação em animais, vêm promovendo inovações científicas para testar a toxidade do produto e, sobremodo, não infligindo sofrimento algum a qualquer ser capaz de sentir dor.
Sérgio Greif leciona que, algumas vezes, a mera substituição do animal por um vegetal ou por um microrganismo é suficiente. Outras vezes, experimentos tradicionais como o do nervo de sapo podem ser substituídos por simulação computacional, acoplada ao sistema de aquisição de dados que permite a realização de experimentos na própria pessoa ou em colegas. (GREIF, 2003, p. 33).
Para Greif, a utilização de animais, para fins didáticos, vem sendo questionada em todo o mundo, tanto pela sociedade civil, quanto por cientistas, profissionais, educadores e estudantes. A argumentação baseia-se em considerações éticas, metodológicas, psicológicas e ambientais. Em todo o mundo, tem-se ressaltado a importância da substituição do uso de animais por técnicas mais inteligentes e responsáveis. (GREIF, 2003, p.23)
Outras palavras que merecem destaque são as de Paulo Affonso Leme Machado (2013, p. 74) quando assegura que: “a harmonização dos interesses em jogo não pode ser feita ao preço da desvalorização do meio ambiente ou da desconsideração de fatores que possibilitam o equilíbrio ambiental. ”
Milaré acredita que não existe qualidade de vida sem qualidade ambiental, e é exatamente esse liame indissociável entre os dois conceitos que erige o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a direito humano fundamental e, mais que isso, a uma das espécies dos chamados direitos personalíssimos. (MILARÉ, 2013, p.120).
A filosofia de Jeremy Bentham (1748 – 1832) diante deste cenário, torna-se apropriada quando afirma que “a questão não é: eles são capazes de raciocinar? Nem tampouco seria: eles são capazes de falar? A questão é: eles são capazes de sofrer? ”
Noutros dizeres, corrobora-se menções da obra “Libertação Animal” de Peter Singer, na qual esclarece que os animais sentem dor, não existindo justificativa para que os seres humanos os obriguem ao sofrimento, a não ser o fato de que os humanos são “especistas” – permitem que os interesses da sua própria espécie dominem os interesses maiores dos membros de outras espécies.
Para Singer, o caso dos animais é idêntico aos racistas, que violam o princípio da igualdade, atribuindo maior peso aos interesses dos membros da sua própria raça quando existe um conflito entre os seus interesses e os interesses daqueles pertencentes à outra raça. (SINGER, 2010, p.25).
Por certo, o tema aqui discutido não será exaurido por um todo, eis que são décadas de discussões e lutas a favor do direito à fauna no Brasil, direito este, previsto constitucionalmente, com o propósito de que não seja mais tolerado que animais sejam vistos como objetos.
Não somente, na data de 27 de maio de 2021, por maioria dos Ministros, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a proibição de testes de cosméticos em animais previstas em lei no Estado do Rio de Janeiro, sob o enredo de que outrora seja competência privativa da União legislar sobre comércio interestadual, o Estado-membro pode sim deliberar sobre a proibição dos testes em animais.
Logo, podemos dizer que, na era do consumismo estético, onde, diariamente são produzidos centenas de produtos de beleza a serem vendidos no mercado, tal decisão espelha uma conquista em prol do bem-estar dos animais, que são utilizados como experimentos, colocados em constante imposição de sofrimento por meio da realização de testes, muitas vezes reconhecidos como desnecessários, violando, sobretudo, o direito à dignidade.
Se um ser sofre, não há justificativa moral para recusar tem em conta tal sofrimento, independentemente da natureza do ser, o princípio da igualdade exige que ao seu sofrimento seja dada tanta consideração como ao sofrimento de um semelhante. ” (SINGER, 2010, p. 24).
Dessa maneira, os defensores da causa, sobremaneira tenham comemorado essa vitória, continuam na luta a fim de que haja a edição de legislações correlatas em todo o país em níveis municipais, estaduais e federal, na medida em que seja consagrado o direito constitucional de proteção à fauna, como um valor essencial em prol dos animais e autônomo dos interesses humanos.